Andava não pelo chão, mas por linhas, observações e denotações feitas na noite passada. Conversava e gesticulava consigo, como se houvesse duas pessoas distintas, sendo que uma arrumava o fone debilitado pelo tempo e a outra remexia a mochila cheia de desnecessariedades. Era uma manhã amena, coisa deveras incomum por aqueles cantos. Pensava nos rabiscos feitos pela caneta às 19:30 e nas mensagens recebidas às 9:00...tudo muito misturado. Informações liquidificadas que precisavam ser remontadas. Tinha medo. Muito medo. Toda manhã era o começo de uma epopéia urbana conduzida por personagens espirituosos, saudosistas, humoristas, egoístas, sistemáticos, maldosos, entre outros, muitos outros. Nem todos eram dignos de grande respaldo. Sempre fazia o exercício de mudar para o outro lado da rua porque era interessante ver o que se passava do outro lado, pois as nuvens eram diferentes, os cães latiam diferente, as donas regavam suas plantas de outro jeito e os carros...bem, esses continuavam a barulhar o ambiente do mesmo modo de sempre. Já longe de casa, enquanto rumava, gostava de observar as pessoas deslocando-se para seus destinos cotidianos (a pressa como combustível do compromisso diário), os perfumes agradáveis, e os nem tanto assim, as moças e suas silhuetas suntosas capazes de quebrar os pescoços dos rapazes, os comerciantes informais com a sua lábia malandra e voz tonante, os idosos que padeciam perante a falta de respeito, os inúmeros detalhes que compunham aquele grande caos organizado chamado sociedade. Todo dia só não era o mesmo dia porque os números do calendário mudavam. Em tempos como aquele, só uma palavra era conforto: perseverança.
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